quinta-feira, 17 de março de 2011

BANDAS DISCUTEM CULTURA DE MASSA E CENÁRIO EM MUTAÇÃO

Thaís Pacheco - Estado de Minas

Banda Pequena Morte busca abrir espaço no mercado indie
Foto: João Miranda/Divulgação

O cantor e compositor Pedro Morais chegou à fase final do curso na Escola de Música da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Sua monografia abordará uma dúvida que o inquieta: como o adolescente adquire consciência crítica sobre música? 
O compositor explica que sua preocupação é mais social que artística. “Falta ao adolescente ouvir tudo e saber escolher baseado na consciência sobre o que vai estimulá-lo intelectualmente”, explica. Pedro tem uma intuição: a criança se move mais influenciada pela sociedade que por conhecimento próprio. A primeira influência vem dos pais, que nem sempre dão a atenção necessária à formação cultural do filho. “Eles se preocupam com a educação, mas é como se música e arte não fizessem parte”, constata. O compositor está convicto de que a cultura de massa é o agente formador de opinião da maioria dos adolescentes.
“A cultura de massa não deveria ser o padrão, e sim mais uma alternativa. Ela é invasiva. Você ouve axé, sertanejo e pagode até sem querer”, diz Pedro. “Parece haver tendência ao descartável em todos os níveis de consumo, inclusive o cultural”, observa ele. Até por isso, a durabilidade de uma obra inserida na cultura de massa costuma ser inversamente proporcional à sua qualidade, acredita o cantor. Artistas independentes, que não foram lapidados por uma gravadora nem tocaram excessivamente no rádio ou na novela, acabam tendo carreira mais longa do que aqueles submetidos à ultraexposição, consumidos vorazmente pela sociedade.
INDEPENDENTE Concluindo mestrado em sociologia na UFMG, a psicóloga Roberta Henriques defenderá tese que aborda essa mesma questão. Ela discute aspectos da cultura de massa, mas foca sua investigação na música independente. “Queria entender que tipo de amparo acaba se criando para a arte sem nenhum tipo de recurso financeiro e marketing conseguir se manter por tanto tempo e com tanto vigor”, explica.
De acordo com ela, as redes são responsáveis por essa realidade. Sejam as sociais – on-line e off-line – ou as de solidariedade. “Elas permitem ações do tipo me empresta seu equipamento que faço o cartaz do seu show”, explica Roberta. Para a psicóloga, trata-se de caminho sem volta: a cultura cada vez mais direcionada para para nichos específicos, trazendo verdadeira mudança para o artista.

Pedro Morais pesquisa a relação dos adolescentes com a música
Foto: Euler Jr./EM/D.A Press

Em sua pesquisa, ela investigou a parcela da população que tem acesso a shows, viagens e internet. “Música independente parece ser feita e consumida pela classe média. Por mais que se formem redes de cooperação, o artista tem de pagar aluguel e comida”, pondera a psicóloga.
“Estamos seguindo um ritmo de consumo cultural mais individualizado. Você consome o que o amigo indica, não o que ouve no rádio. A TV já não retrata a realidade, que pode estar num link do Twitter”, garante Roberta. Ela lembra que o maior grupo independente do Brasil é a Banda Calypso. Criado há 11 anos no Pará, o grupo mistura ritmos regionais nortistas, iê-iê-iê, rock, lambada e reggae. Esnobada pelas gravadoras e a grande mídia no início de sua carreira, a Calypso lançou discos independentes de sucesso, sobretudo entre o povão.
Liderada pelo guitarrista Chimbinha e a cantora Joelma, a banda se transformou em fenômeno do mercado musical. O primeiro álbum vendeu 500 mil cópias e o segundo, 750 mil, enquanto as majors da indústria fonográfica amargavam séria crise. Com shows lotados, a Calypso vendeu nada menos de 7 milhões de CDs e DVDs até 2006 – sem considerar a pirataria. Atualmente, redes de TV, revistas e gravadoras se renderam à banda.
No meio-termo entre a cultura de massa e as soluções coletivas, a banda Pequena Morte segue seu caminho. O assessor de imprensa e produtor Victor Diniz se uniu ao baixista Gabriel Assad e ao baterista Tamas Bodolay para abrir uma empresa de comunicação, que cuida dos shows do grupo.
Depois de participar de evento na cidade italiana de Verona, o grupo acredita que pode organizar espetáculos que possibilitem ocupar o espaço público e dar chance a artistas independentes. Daí surgiu o festival S.E.N.S.A.C.I.O.N.A.L, que já teve duas edições em BH: embaixo do Viaduto Santa Tereza e na Savassi (há poucos dias, atraiu 8 mil pessoas em festa de pré-carnaval).
Hora de agir 
Pedro Morais tem 29 anos, Roberta Henriques, 30. A banda Pequena Morte é formada por jovens: Victor Diniz e Gabriel Assad têm 26; Tamas Bodolay, 28. A palavra de ordem dessa geração é agir – seja por meio de projetos artísticos, organizando eventos ou formatando pesquisas acadêmicas.
Pedro mantém carreira solo como músico. Para pagar as contas, batalha para aprovar projetos nas leis de incentivo. Roberta Henriques trabalha na coordenação de sustentabilidade do Coletivo Pegada.
A Híbrido, agência criada pelos rapazes da banda Pequena Morte, é “agência de comunicação que produz cultura e produtora cultural que comunica”, brinca Victor Diniz. Roberta avisa: “Discordo totalmente de quem diz que somos alienados. Muitas de nossas revoluções começaram no Twitter. É certo que temos de sair um pouco de lá e do sofá, mas conheço muita gente profundamente insatisfeita, com vontade de fazer algo. Tenho acompanhado certos movimentos por parte de gente que tem atitude, como é o caso da ministra da Cultura. Isso tem gerado mais que tweets. Há gente pensando, gerando documentos, pesquisando e entendendo os processos em torno da arte”, conclui Roberta.
 

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