sábado, 11 de fevereiro de 2012

VIVEMOS A CULTURA DA DESORIENTAÇÃO?

Por Tadeu Oliveira

Recentemente li o livro A cultura-mundo: resposta a uma sociedade desorientada, de Gilles Lipovetsky e Jean Serroy, lançado pela Companhia das Letras, que aborda com profundidade os efeitos provocados pela cultura de consumo no mundo atual, nossas relações interpessoais e as experiências imediatistas que o novo consumidor cultural requisita.

Esta forma de relação, ao mesmo tempo em que nos dá a sensação de bem-estar material e físico, de autonomia e livre escolha oferecidos pela enorme diversidade de meios de comunicação e de informação, provoca também incertezas, dependências, indecisões e inseguranças em relação à nossa identidade.

Para exemplificar, basta observarmos as nossas relações sociais e afetivas que acentuam o sentimento de solidão e de individualidade: “são milhares de pessoas conectadas umas às outras mundo afora e, ao mesmo tempo, são milhares de pessoas com a sensação de isolamento”.

Ao longo de quase 14 anos residindo e convivendo com diversas pessoas das mais variadas classes sociais na região do Médio Jequitinhonha observa-se que, a despeito da carência de capital social, educacional e econômico, historicamente forjou-se um capital cultural calcado na oralidade para transmitir saberes e fazeres incorporados pelas pessoas que habitam a região e que torna-se sua maior força coletiva.

Nas minhas andanças pelo Vale do Jequitinhonha afora e adentro, conheci pessoas ligadas a visões tradicionais do mundo, com valores morais e regras de convívio sociais específicos que refletem na diversidade de ser dessas pessoas. São contadores de causos, benzedores, repentistas, artesãos, na maioria analfabeta, no entanto repletos de sabedorias centenárias.

Seu Geraldo e as primeiras violas
Lembremos do Sr. Geraldo Pinheiro, conhecido como Geraldo da Viola, que participou como convidado do Canta Minas dando ao programa um caráter bem próximo das camadas populares devido ao seu jeito simples de expressar. Posteriormente, ele nos surpreendeu ao revelar-se luthier autodidata (ou fazedor de violas, como ele mesmo prefere se autodenominar). Hoje ele continua abrilhantando um outro programa matinal da Aranãs FM com suas prosas e tiradas bem ao gosto popular.

Tão logo o programa volte ao ar, pretendo criar um quadro mensal com mestres de ofício visando à valorização dos saberes e fazeres da cultura popular que estão se perdendo por causa do desenvolvimento tecnológico e das novas formas de comunicação.

A facilidade e o acesso a novas tecnologias aliadas à responsabilidade social poderiam ser facilitadores na condução das políticas culturais que promovessem pesquisas e valorização destes saberes e fazeres, cabendo principalmente aos jovens de hoje o papel de preservar os valores tradicionais, atitude primordial para a afirmação de nossa identidade, embora ele também tenha toda a liberdade de criar novas formas de expressão cultural que estão ligadas ao seu tempo. Isso com certeza preencheriam o vazio existencial pelo qual atravessamos nos nossos dias.

Ao ler A cultura-mundo, me veio à cabeça a célebre frase de um outro livro, Alice no país das maravilhas: “para quem não sabe para onde vai qualquer caminho serve”, pergunta que coloca em cheque quem quer que se encontre perdida sem sabe pra onde ir. Talvez a resposta mais coerente para esta sociedade desorientada seria quem não sabe para onde está indo devia ao menos saber de onde está vindo”.