O BOI DA MANTA
Tadeu Oliveira
Zé Rico foi um grande apaixonado pelo carnaval de Corinto. Num dos carnavais da década de 1970, ele criou o bloco da Lídia, uma boneca negra imensa vestida de chita, bem ao estilo daquelas bonecas do carnaval do Recife.
No carnaval seguinte, Zé Rico apareceu com um outro personagem, o Cabeção. Como o próprio nome sugere, era um boneco de cabeça enorme e que desfilava cortejando a sua amada Lídia.
Lídia e Cabeçao 2010 - Foto: Tadeu Oliveira |
Percebendo que a cada ano o bloco crescia, Zé Rico apareceu com mais uma novidade: colocou um boi para abrir alas. Conhecido como Boi da Manta, uma variação do Bumba-meu-boi, o novo personagem investia sobre a multidão para abrir alas para o Bloco da Lídia e do Cabeção desfilar arrastando os seus passistas ao batuque dos ritimistas.
O Boi, assim como os bonecos, era constituído por uma armação feita de papel machê pintado de preto sobre uma estrutura trançada de arame e muito bem compacto. Na verdade, parecia mais um enorme touro negro com uma espécie de parangolés a enfeitá-lo. A parte de baixo era aberta e cabia uma pessoa que se encarregava de conduzí-lo pela rua afora.
O Boi da Manta era uma atração à parte para a molecada. O prazer dos meninos era cutucá-lo na expectativa de vê-lo investindo sobre a multidão que fugia em polvorosa.
Deu-se que o Bloco da Lídia, do Cabeção e sua filharada se preparava para mais um desfile. Todo mundo eufórico: os passistas se esmerando nas indumentárias, os ritimistas afinando o couro dos instrumentos e Zé Rico dando os retoques finais.
Quando já se encaminhavam para as bandas da Rua do Footing, local de aglomeração dos blocos, alguém gritou que o boi ficara para trás. Para sair debaixo das bonecas era uma disputa danada. Mas para sair debaixo do Boi da Manta, poucos se arriscavam. O boi sempre sobrava para Mossorongo, alcunha de Vicente Conceição Magalhães, um sujeito simples, funcionário de um açougue local. Mossorongo sempre adorou carnaval e era sempre cogitado para empurrar os carros alegóricos ou os carrinhos que transportavam os tambores treme-terra, botijões de gás e outros instrumentos percussivos. (Em Corinto, o botijão de gás vazio era peça fundamental nas baterias de escola de samba).
E assim, correram lá no barracão do fundo da casa de Zé Rico e trouxeram o boi colocando-o sobre Mossorongo já a caminho da Rua do Footing. Como havia cerca de um ano que o boi estava encostado, arrumaram um molambo e bateram sobre ele a fim de retirar o excesso de poeira.
O Boi da Manta em 2010 - Foto: Tadeu Oliveira |
Os policiais que faziam a segurança através de um cordão de isolamento começaram a ficar preocupados porque nem mesmo o mais respeitado e temido soldado do pelotão corintiano, o João Preto, deu jeito no Boi. Este, audaciosamente, chegou a desferir-lhe uma chifrada na altura do baixo ventre. Aí foi demais!
O pessoal do bloco começou a estranhar, afinal Mossorongo era um sujeito pacato. Não era dado a estripulias e nem bebia a ponto de sair do normal. No entanto, ele estava indócil e incontido.
E ali, na esquina da Rua do Footing com a Capitão Altino, quase de frente a antiga loja do Disco Brasa, pararam o desfile para verificar o que se passava com Mossorongo.
Após muita peleja e safanões, enfim o dominaram. Houve alguma dificuldade ao tentarem retirar a armação de cima de Mossorongo porque ela se enganchara em sua cabeça. Quando enfim o livraram do boi, para surpresa de todo bloco, a cabeça de Mossorongo estava num inchaço só, emendando as bochechas com as orelhas e o pescoço.
Como o boi ficara quase um ano guardado lá nos fundos do barracão de Zé Rico, foi o bastante para que marimbondos construíssem uma casa dentro do corpo do boi. Quando Mossorongo meteu a cabeça boi adentro, esmagou a caixa de marimbondos com o cocuruto. A dificuldade de se ver livre daquele boizão pesado por si só e o barulho do batuque impediram que o bloco ouvisse seus pedidos de socorro. O desespero foi tão grande que Mossorongo se debatia em vão. Explica-se , portanto, tamanha animação e acrobacias do Boi da Manta.
Fonte da ilustração: Blog do Chico de Paula
Thadeu, estou rindo até agora!Coitado do moço,que desespero!Esse "causo" é de verdade mesmo?
ResponderExcluirUm beijão,
Anna Paula que era de Corinto e depois de Capelinha.
Ana Paula,
ExcluirTodo mundo de Corinto diz que é verdade. Inclusive, quando fui escrever o causo, pedi Clovinho para consultá-lo se eu poderia usar o apelido dele. Ele foi taxativo: pode contar o fato, mas tem colocar o meu nome todo: Vicente Conceição Magalhães. E exigiu um cópia.
Beijos Gerais!!!
Tadeu Oliveira
Zoronga garimpou uma boa história prá contar... Já dei boas risadas por aqui!
ResponderExcluirOlá Maria Zoronga,
ExcluirQue bom que gostou! Esse é um caso acontecido verdadeiramente lá na minha terra. É claro que quem conta um conto aumenta um ponto. Quando solicitei ao protagonista autorização para publicá-lo, ele só colocou uma condição: que você coloque o meu nome completo e não o apelido. Infelizmente, o nosso protagonista já não está mais entre nós.
Abraços Gerais! Inté, uai!!!